Secos & Molhados

A capa do primeiro disco, lançado em 1973, é considerada uma das mais bonitas – se não a mais – da história da música popular brasileira. Nela, as cabeças dos integrantes da banda — Ney Matogrosso, João Ricardo e Gérson Conrad — aparecem sobre uma mesa de jantar, como se fossem os pratos principais de um insólito banquete antropofágico. A quarta cabeça que aparece na imagem é a do baterista Marcelo Frias, que não se juntou ao grupo embora tenha participado do disco. Sobre a toalha, pão, linguiça, feijão, vinho, sabonete, enfim: secos e molhados.

O disco superou 700 mil cópias vendidas. Nas músicas, uma mistura de rock e canção, conduzida com irreverência e carisma. O maior sucesso veio com “O Vira“, espécie de síntese da musicalidade do grupo: uma dança tradicional portuguesa transformada em rock, com direito a uma guitarra distorcida desde a introdução e vocais repletos de falsetes. “O gato preto cruzou a estrada / passou por debaixo da escada”.

Ainda nesse disco, havia uma versão musicada do poema “Rosa de Hiroshima“, de Vinícius de Moraes, atual em razão da Guerra do Vietnã (“Pensem nas crianças / mudas telepáticas”) e a dançante “Mulher Barriguda“, cujos versos flertavam com a temática social (“Mulher barriguda, que vai ter menino / qual o destino que ele vai ter? / o que será dele quando crescer?”). Nos shows, o visual andrógino, os rebolados, a maquiagem ao estilo glam rock de David Bowie e as roupas exóticas completavam a atuação performática, transformando-se em assinaturas.

Logo após o lançamento do segundo LP, em 1974, o grupo foi desmanchado em razão de disputas internas. Em 1975, Ney Matogrosso, principal revelação do Secos & Molhados, lançava o primeiro disco solo, o experimental Água do Céu-Pássaro, inaugurando uma bem sucedida carreira de cantor.

Apresentação de "Sangue Latino" no estúdio do programa "Siempre en domingos", produzido no Brasil por uma emissora mexicana e exibido pela TV Tupi

frases

  • "A exótica e aguda voz de Ney Matogrosso, os rostos ocultos pela pintura e muita purpurina, os trejeitos rebolantes e uma forte dose de androginia, um tanto exagerada para a época, foram os elementos que detonaram a carreira meteórica do Secos & Molhados, grupo intérprete de 'O Vira', um rockinho vulgar sobre a dança portuguesa." (Jairo Severiano e Zuza Homem de Mello, em "A canção no tempo", de 1998)

    "Durante os anos 70, além de Raul Seixas, alguns grupos tiraram um som marginal à tendência progressiva dominante. O mais bem-sucedido — apesar de ter durado somente dois anos e uns quebrados — foi o Secos & Molhados de Ney Matogrosso, Gerson Conrad e João Ricardo. Entre 1971 e 1974 eles hipnotizaram o país com o folk de 'O Vira', 'Sangue Latino', 'El Rey', 'As Andorinhas' (sobre poema de Cassiano Ricardo) e 'Rosa de Hiroshima' (idem Vinícius de Moraes). (...) A beleza, a leveza e relativa simplicidade dos arranjos, aliadas ao impacto da figura andrógina de Ney Matogrosso, fizeram do grupo uma coqueluche nacional." (Arthur Dapieve, em "BRock: O rock brasileiro dos anos 80", de 1995)